
Um dos principais objetivos do Consórcio Nordeste na COP30 é incluir o bioma Caatinga na agenda climática global. O desafio é reposicionar o olhar mundial: de um bioma marcado pela escassez para uma grande floresta de alta potência ambiental e econômica, essencial no combate às mudanças climáticas.
O painel “Brasil Nordeste: Onde o Oxigênio se Renova”, realizado na tarde desta segunda (11), no Espaço Brasil Nordeste, na Zona Verde da COP30, reuniu especialistas do Instituto Nacional do Semiárido (INSA), da Embrapa e representantes do Consórcio Nordeste. O debate destacou o papel estratégico da Caatinga na conservação da biodiversidade e na geração de créditos de carbono, um ativo cada vez mais valorizado na economia verde.
“Trabalhamos para que a Caatinga seja vista não apenas como território para turbinas eólicas ou fazendas solares, mas como um espaço de inteligência ecológica, capaz de reverter a desertificação e gerar riqueza sustentável”, afirmou Glauber Piva, chefe de gabinete do Consórcio Nordeste.
Durante o painel, o diretor do INSA, professor Etham Barbosa, e o pesquisador da Embrapa, Carlos Gava, apresentaram resultados de pesquisas que consolidam a Caatinga como um sumidouro de carbono de alta eficiência.
A singularidade do bioma está na forma como ele armazena carbono: a maior parte fica retida nas raízes e no solo, e não nas folhas ou no tronco, como nas florestas tropicais úmidas.
“A Caatinga úmida pode sequestrar 5 toneladas de carbono por hectare. Ela seca, 1,5 a 3 toneladas. Mesmo sem folha, sem nada, ela sequestra 3 toneladas de CO2. Isso no sistema radicular. Ela adormece no período seco, perde as folhas, mas ela está extremamente ativa na região das raízes”, explicou Etham Barbosa.
Ele destacou que a manutenção da Caatinga em pé tem um potencial econômico estimado em R$ 20 mil por hectare ao ano em créditos de carbono, considerando o estoque no solo, o sequestro líquido e a conservação de água e nutrientes.
O debate reforçou a necessidade de certificação do carbono da Caatinga para que o Nordeste possa competir no mercado internacional de créditos de carbono, transformando a conservação do bioma em fonte de receita, investimento e inclusão produtiva.
“Esta é a COP da ação e para a Caatinga também precisa ser. Temos a ciência, o planejamento e as ideias. Agora é hora de agir”, ressaltou Pedro Lima, secretário de Desenvolvimento Regional do Consórcio Nordeste.
Hoje, as certificadoras internacionais ainda desconsideram o carbono subterrâneo, o que subvaloriza o potencial real da Caatinga.
“As metodologias globais medem o carbono apenas na biomassa aérea. Precisamos mostrar que a Caatinga é diferente, uma floresta que guarda sua força nas raízes”, afirmou Gava.
Ele defendeu o avanço da ciência como instrumento de transformação. “Precisamos publicar mais estudos em revistas de alto impacto e ocupar espaços decisórios, como o IPCC, que define as metodologias aplicadas no mundo inteiro.”
Único bioma exclusivamente brasileiro, a Caatinga é o semiárido mais populoso do planeta, abrigando 32 milhões de pessoas e 54% da agricultura familiar do país.
Ela se estende por nove estados do Nordeste e parte do norte de Minas Gerais, abrigando cerca de 5 mil espécies de plantas (mais de 700 endêmicas) e 1.200 espécies de animais, sendo 132 exclusivas.
O aquecimento global e a desertificação ameaçam essa biodiversidade, que o professor Etham Barbosa chama de “irmã gêmea da crise climática”.
“Mudança climática, perda de biodiversidade e desertificação são faces do mesmo problema. Precisamos enfrentá-las de forma integrada”, completou Pedro Lima.
O INSA apresentou projetos que demonstram o potencial bioeconômico da Caatinga, como o índigo orgânico desenvolvido em parceria com o Grupo Guararapes, usado em cosméticos, antibióticos e larvicidas.
A Embrapa destacou a descoberta do bacilo aerotropical na raiz do mandacaru, que deu origem ao produto comercial Aura, capaz de aumentar a resistência à seca em outras plantas. Outro estudo analisa a genética da chamada “planta da ressurreição” (Jericó), que se regenera mesmo após longos períodos sem água.
O Consórcio Nordeste apresentou seus esforços para garantir políticas públicas voltadas à valorização do bioma, com destaque para dois projetos estratégicos:
O painel reafirmou a Caatinga como um ativo ambiental e econômico inestimável, com papel central na retenção de carbono, na adaptação climática e na nova economia verde. Mais do que um bioma de resistência, a Caatinga é uma floresta subterrânea, viva e essencial para o futuro do planeta.